segunda-feira, 27 de abril de 2015

...continuarei


…continuarei

a pisar o chão e a cinza,
oscilando a sombra dos corpos,
evocando palavras vazias,
insaciáveis, suspeitas e sobrepostas
entre a névoa e o ruído côncavo,
movimento súbito e amargo.

a sarar as feridas do horizonte,
a tactear as cicatrizes da terra,
estilhaçando o olhar devastador
consumido pelo suor e pelo cansaço,
ao ritmo deste coração inerte
debruçado sobre o abismo.

a rasgar as páginas ímpares
reflectidas na sua assimetria,
silenciando o seu contorno
translúcido e existencial,
enaltecendo a palavra prenunciada
no limiar da tempestade.


Marco Mangas @ 27 de Abril de 2015

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Madrugada





Era madrugada,
e lá estava de braços ancorados à terra,
reflexo  perdido de um espelho árido
submerso no fundo do mar pleno,
adormecido pelo silêncio da noite,
rasgando todos os versos envelhecidos,
fragilidade corpórea…
Passaram horas, marés,
(outra alvorada)
e lá estou, fulcro da memória,
flores de pânico submersas,
ossos triturados de uma página,
conchas quebradas, vazias…

…matéria saboreada pelos olhares do sul.


 Marco Mangas

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Visão



Visão turva de uma miragem,
ante um corpo de pedra e pó,
numa encruzilhada carnal,
faminta, imperfeita e involuntária.
Os dias são perpétuos,
silhueta de um cortejo repetitivo
que inebria as horas inconscientes
deste singelo percurso,
prova de minha herança,
meu retrato grisalho...
Pretendo plagiar a visão
do alimento de uma árvore,
abrigo de um fruto efémero,
submisso ao seu tempo e à sua quadra,
remetido ao seu silêncio
leviano, fátuo, mas feliz…


Marco Mangas @ 17 de Abril de 2015


terça-feira, 7 de abril de 2015

Encanto


No encanto da sublime voz de sueste,
diante um mar tenebroso trajado de negro,
encontrei um passageiro disfarçado,
 um fingidor,
(en)coberto  de algodão, sódio e revolta,
arrastando todas as âncoras e amarras
ao seu melhor sabor
e prazer
amargo, bravio, incoerente,
que me apraz…
Mar d’encanto, figura do desejo
alimentado p’la força das palavras
que confrontam a  tempestade
com a sede de meus olhos,
enfrentando e devorando os socalcos da terra ,
incessante, sem dó, nem dor,
numa alucinação deslumbrante e voraz,
vertiginosas rajadas sem cor,
sombra do que é capaz,
este encanto…

Marco Mangas @ 7 Abril de 2015