Trago na memória
capítulos inertes deste lugar comum.
Ainda vislumbro o despertar das cortinas,
cercado pela luz do silêncio,
embaraçado em lágrimas secas
vertidas em chama amarga
de uma vida crua e vazia.
O grito era o alento suado
das manhãs pálidas e fiéis,
reflexo do espelho turvo
situado sobre a velha cómoda de pinho
que ainda tresanda a mofo.
Lá fora, numa azáfama,
os pássaros alimentavam suas crias,
crianças corriam e saltavam pelos canteiros,
transbordavam gargalhadas,
sorrisos severos e espontâneos.
E eu ali… sem fôlego, arqueado,
descalço, enrolado no andrajo,
a observar o meu próprio reflexo
em busca da chave
que abrirá a porta deste lugar secreto,
deste pesadelo de criança.
Marco Mangas @ 18 de Março de 2015